Um Sentimento Chamado...

- Como se chama essa sensação? Diz a filha.
- Para que você quer saber isso? indaga a mãe.
- Porque eu quero saber, estou com essa sensação...
- Não é nada demais, logo vai passar.
- Mas é que está durando por dias e não sei explicar o que é...
- Não se preocupe, oras... estou lhe dizendo que vai passar, é questão de tempo.
- Ahn! se não quer falar, não precisa ficar me enrolando!
- Olhe os modos menina, estou lhe dizendo que não precisa se preocupando!
- Voce que faz pouco caso com as minhas coisas e agora vem falar isso!
- Vai querer discutir por bobeiras agora???
- Viu!! Voce sempre trata os meus assuntos como bobeira!!!
- Voce quer que eu faça o que?!?!
- Que apenas me respondesse normalmente,como... mas pensando bem... nem preciso mais que me dê ouvidos... não faço mais questão das suas palavras!!

Essa última frase atinge a mãe como uma facada em suas costas...
ela apoia os braços na pia e fica lá imóvel
larga a faca que estava segurando
larga o legume que estava cortando
larga as lágrimas de seus olhos...

E assim a filha segue o seu rumo...
sem saber o que significava aquela sensação.


Depois daquela discussão nunca mais
trocaram olhares
trocaram palavras
trocaram afetos
trocaram perdões...

Os anos se passam,
ela resolve estudar fora...
se torna uma excelente profissional
se torna uma grande mulher

Possui muitas virtudes
desconhece as fraquezas
... do lado profissional.

Aquela pergunta que surgiu
quando era jovem
se tornou algo banal
motivo dela sorrir
quando lembra de tal...

Um pouco de flashback...
Uma vez o pai tentou conversar com a filha
e ela disse
- Ela que tem que se desculpar!
maldito orgulho...

Nunca tocou nesse assunto com outra pessoa
Mas por um bom tempo
Teve vontade de tomar atitudes... que o orgulho não permitiu...

Uma pessoa tão ocupada
Tantos assuntos
profissionais
não teria tempo... para sentimentos...



não agora...



Ela trabalha na europa...
tão distante...
preferiu fugir do clima ruim
que estava.

Um dia ela não acorda bem
com fortes dores de cabeça...
Prefere ficar em casa
Avisa a empresa, que a libera sem maiores problemas.

Mau pressentimento?

Toca o telefone.

Ela não atende
sua dor de cabeça é mais importante.

O telefone torna a tocar novamente

Ela não se move
e logo cai em um sono profundo.

Amanhece...
e ela está melhor
sua dor de cabeça passou

Alívio...
passado a dor
agora a tranquilidade
para retomar a rotina.

O telefone toca...
Ela atende...
fica parada...
apenas escuta...

Desliga e corre
corre como nunca
nunca pelo serviço
nunca pelos namorados
nunca pelas promoções
nunca pelas novelas
nunca pelas séries de TV...

Consegue pegar um vôo
urgente...



sua mãe está doente... doença grave...
e uma atitude automática
ela não pensou em nada
apenas correu...
queria voltar...
e foi isso que ela fez.

durante o vôo... não pode receber ligações...
longa espera
sofrimento...
angústia...
dores que não havia sentido antes...
ela passa a conhecer outros sentimentos...

Chegando...
A primeira coisa que faz
é pedir
um taxi... para a casa...

(sua mãe havia recebido uma alta e estava se tratando em casa - segundo a última ligação que recebera)

Chegando...
Em casa, ela entra
e pelos corredores
que a sufocam...
aquele ar pesado...
parecia que as paredes a prensavam

As escadas
ela sobre... uma a uma
tontura é o que ela está sentindo
e seu suor frio
escorre por entre os dedos e seu rosto
fazendo sua mão deslizar pelo corrimão...

Caminha...
até a porta do quarto de sua mãe...
lá está ela...
deitada
com o pai ao lado...

Ele se levanta...
vai em sua direção
coloca a mão em seu ombro
lhe dá um sorriso que diz:
- Eu te amo, minha filha...
e sai do quarto...

Ela caminha em direção à cama...
ao sentar-se no banquinho
que o pai estava sentado
ela ve a mãe...
fraca...
magra...

Ela abre os olhos
vê a filha
e solta um discreto sorriso
e mostra a palma da mão...

Desde quando ela foi tão magra?? indaga para si mesma a filha.
e coloca sua mão sobre a palma da mão da mãe.

palma... que se encontra fria...
como um gelo...
mas ela não solta a mão da mãe...
agarra firme...

a mãe pede para ela aproximar-se
levemente
ela quase encosta a cabeça
junto aos lábios da mãe
que diz:


- Se chama... saudade...

e logo sorri para a filha...
um sorriso... seguido de um silêncio...


silêncio eterno... por parte da mãe...
choro inconsolável... por parte da filha...

A filha sentia saudade das conversas com a mãe
que não conseguia corresponder como antes
e estava irritando a filha...
não era falta de atenção...
não era incompreensão...

E as palavras da filha?
Cortaram a vida da mãe...
que dor é pior
que ser desprezada pela filha?

Palavras
que tiraram sua vontade de viver
que tiraram sua vontade de lutar
ela desistiu da vida...

Dor
de uma porrada você consegue descrever
de um corte você consegue descrever
e de uma palavra??

Saudade
de uma pessoa
de um momento
não confunda com obsessão.

Você me perdoa?

É claro! É o que dizia os olhos da mãe...


antes de fechar e nunca mais abrir.





OBRIGADO ESPECIAL PARA A Mah!
que sugeriu esse tema =0)